08/09/2017

16:29

O que está acontecendo no mercado brasileiro de leite?

Fonte: Milkpoint e Milkpoint Radar

Dentre as diferentes variáveis que influenciam o mercado lácteo brasileiro, a produção nacional de leite é, provavelmente, a que mais diferença vem fazendo este ano.

Enquanto que em 2015 e 2016 a produção caiu, respectivamente, 2,8% e 3,7% (depois de 20 anos de crescimento ininterrupto!), os números preliminares deste ano mostram um aumento significativo dos volumes produzidos. Este aumento da oferta pode ser observado pela evolução dos volumes de produção dos participantes do MilkPoint Radar, aplicativo gratuito de compartilhamento de informações entre produtores de leite e consultores.

O crescimento da produção de junho em relação a maio foi de 6,4% e, no fornecimento de julho, o cenário indica também, crescimento de 5,7% nos volumes de produção em relação ao mês anterior. É possível notar, no gráfico 1, que estes valores seguem muito superiores à média histórica reportada pelo IBGE (de 1997 a 2016).

Gráfico 1. Variação de oferta entre os meses – MilkPoint Radar x IBGE (média histórica). Fonte: elaborado pelo MilkPoint Radar, com base em dados do MilkPoint Radar e IBGE.

mercado brasileiro de lácteos

Outro dado que chama atenção é o crescimento segundo o Índice de Captação – ICAP, apurado mensalmente pelo Cepea. Segundo este indicador, o crescimento acumulado dos volumes de leite captados pelas empresas pesquisadas é de 6,2% entre janeiro e julho deste ano em relação ao mesmo período de 2016. Chama a atenção a aceleração do crescimento dos volumes, chegando, no mês de julho deste ano, a um crescimento de 14,1% em relação ao índice de julho/2016 (gráfico 2).

Gráfico 2. Evolução do ICAP/Cepea – 2017 vs. 2016. Fonte: elaborado pelo MilkPoint Mercado, com base em dados do Cepea.

mercado brasileiro de lácteos

Considerando que, de janeiro a julho de 2016 a produção formal de leite brasileira(segundo aferição da Pesquisa Trimestral do Leite do IBGE) foi de 12,9 bilhões de litros de leite, um crescimento de 6,2% nestes volumes em 2017 (conforme este sinalizado pela variação do ICAP) significaria cerca de 800 milhões de litros a mais no mercado. É importante informar, no entanto, que os dados oficiais do IBGE referentes a produção de leite no segundo trimestre de 2017 serão divulgados no próximo dia 14/09 (historicamente, o ICAP tem uma correlação com o índice oficial do IBGE da ordem de 89%).

Para o Diretor de Agropecuária da Aurora Alimentos, Marcos Antônio Zordan, o excesso de produção de leite vem preocupando o setor leiteiro de Santa Catarina. No último fim de semana, em uma rádio catarinense, ele destacou que o setor pode entrar em crise por excesso de produção, queda no consumo e importações, o que provocaria uma super oferta e comprometeria a renda das indústrias de laticínios, fato que refletiria na baixa dos preços pagos ao produtor.

Do lado das importações, assunto recorrente e preocupação bastante presente nas discussões do setor, os volumes comprados pelo Brasil no exterior de janeiro a julho deste ano são, em equivalente litros de leite, 13,5% menores que as compras de 2016. Em 2016, de janeiro a julho, foram internalizados cerca de 1 bilhão de litros de leite equivalente e, em 2017, este número foi de cerca de 869 milhões, um volume ainda significativo, mas cerca de 131 milhões de litros menor que no ano passado.
Do lado do consumo final, infelizmente o cenário é semelhante a 2016 e 2015.

Segundo dados da Nielsen, apresentados no Fórum MilkPoint Mercado realizado no início de agosto em Uberlândia, a queda de volumes de venda da cesta de lácteos (que agrega todos os derivados lácteos monitorados no varejo pela empresa de pesquisa) é de 4,5% no primeiro semestre deste ano em relação ao ano passado. Como todos sabemos, esta queda de consumo (e de vendas aos consumidores finais) tem grande relação com a situação de recessão da economia brasileira e com o elevado nível de desemprego, que juntos desestimulam o consumo de lácteos. Adicionalmente, vale lembrar que, nos primeiros 6 meses do ano, os preços ao consumidor para os queijos e leites em pó estavam mais altos do que em 2016, o que agrava a situação de consumo.

Neste cenário, vemos os preços caírem, já há algum tempo, no atacado (preços de venda da indústria aos canais de varejo), no mercado spot (leite vendido entre indústrias) e, mais recentemente, no varejo e ao produtor. Nessa linha, algumas redes varejistas estão realizando promoções para a venda de leite e escoamento dos produtos envolvendo várias marcas.

Nos valores pagos aos produtores de leite a queda acumulada já ultrapassa os 12 centavos por litro, observada no aplicativo MilkPoint Radar nestes últimos meses. Observe no gráfico 3 abaixo como evoluíram os indicadores de preço nos últimos 12 meses de análise.

Gráfico 3. Evolução dos indicadores de preços líquidos do MilkPoint Radar.

Fonte: MilkPoint Radar

A queda nos preços tem sido a realidade para a maioria dos produtores que participaram do MilkPoint Radar em agosto – cerca de 83% de nossa base, podendo ser observada em todas as faixas de produção e variando entre -5 (abaixo de 250 litros/dia) e -9 (acima de 6.000 litros/dia) centavos – gráfico 1.

Gráfico 4. Preços líquidos por faixa de produção (leite pago em agosto). Fonte: MilkPoint Radar.

mercado brasileiro de lácteos

De forma geral, o cenário de queda de preços ao longo da cadeia tende a persistir, dado o quadro de crescimento (ainda significativo) da oferta e a falta de reação na ponta consumidora.

O que pode trazer novidades para este cenário?

De um lado, as quedas nos preços aos produtores e a sua intensidade daqui para frente podem trazer desestimulo à produção, reduzindo o ritmo de crescimento observado até o momento – isto reduziria o crescimento da oferta interna de leite. Ao mesmo tempo, as reduções de preços ao longo da cadeia produtiva podem voltar a estimular o consumo de lácteos, bastante sensível a variações de renda e de preço.

Finalmente, a própria reação da economia brasileira pode ajudar. Segundo apuração do IBGE, a variação do PIB brasileiro no segundo trimestre deste ano (em relação ao mesmo trimestre de 2016) já deixou de ser negativa, com crescimento de 0,3%. Ainda que bastante pequeno, este crescimento do PIB já parece ter estimulado o consumo das famílias, também medido pelo IBGE, que apresentou crescimento de 0,7% no trimestre em relação ao ano passado. Seria uma luz no fim do túnel? Esperemos que sim!

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